Ninguém sabe o que passa dentro do outro, não é mesmo? E julgar, na maioria das vezes é a pior atitude. Mas como identificar uma pessoa com tendências e pensamentos suicidas e o mais importante: que atitude tomar e como ajudar uma pessoas com pensamentos suicidas? Nesse artigo quero abraçar a causa e falar um pouco sobre esse tema complexo e delicado. Me utilizarei de minha experiência enquanto psicóloga hospitalar e darei algumas orientações.
Você já reparou que cada vez mais tem sido veiculadas muitas informações sobre o suicídio no Brasil e no mundo? Esse mês estamos na campanha do “setembro amarelo”, que é uma forma de conscientizar toda população sobre os números crescentes de suicídio no mundo, e ser uma forma de discussão sobre a prevenção e alerta dos sinais.
Afinal, a pessoa que pensa em tirar sua própria vida vive em uma constante ambivalência, e se dada a atenção necessária ao sofrimento emocional é possível evitar que esse comportamento autodestrutivo seja consumado.
A mensagem que desejo deixar com esse texto é que devemos identificar e tratar os pensamentos suicidas e impulsos de morte, com o foco na prevenção desses sintomas e erradicá-los ao notarmos em amigos, conhecidos ou em nossas próprias emoções negativas.
A vida vale muito mais do que possamos mensurar em uma crise por mais imensa que ela seja. Nossa missão enquanto seres humanos é lutar até o final deixando exemplos de superação na vida para ajudar nossa espécie a vencer as dificuldades e construir um mundo melhor. Por isso quero falar hoje sobre minha experiência como psicóloga hospitalar e repassar o conhecimento que esses momentos com pessoas em fragilidade emocional me trouxeram.
O SUICÍDIO EM NÚMEROS PREOCUPANTES
Irei falar estatisticamente para termos uma ideia de como devemos pensar urgentemente em uma sociedade com melhor desenvolvimento humano e qualidade de vida.
Em números totais de mortes, comparados com outros países o Brasil está em nono lugar numa escala mundial, com 24 mortes por dia. De acordo com a Associação Brasileira de Psiquiatria(2009), no Brasil ocorrem 4,5 suicídios por cada 100.000 habitantes por ano.
A região sul do Brasil, mas especificamente o Rio Grande do Sul, apresenta as maiores taxas de óbito por suicídio. Segundo dados do ano de 2005, a média estadual foi de 10 suicídios para cada 100 mil habitantes.
De acordo com dados recentes da Organização Mundial de Saúde (OMS), 800 mil pessoas cometem suicídio todos os anos. E para cada caso fatal há pelo menos 20 tentativas fracassadas. Estima-se que em 2020, aproximadamente 1,53 milhões de pessoas no mundo morrerão por suicídio. Um número 10 a 20 vezes maior de pessoas tentará suicídio, o que representa um suicídio a cada 20 segundos e uma tentativa de suicídio a cada um a dois segundos.
Esses números devem ser o bastante para nos preocuparmos e começarmos buscar soluções.
TRÊS CARACTERÍSTICAS PSICOLÓGICAS DE UMA PESSOA COM PENSAMENTOS DE MORTE
AMBIVALÊNCIA
O desejo de viver e o desejo de morrer batalham em uma gangorra. Há uma urgência de sair da dor de viver e um desejo de viver. Muitas pessoas suicidas não querem realmente morrer. Se for dado o apoio emocional necessário, o desejo de viver aumentará e o risco de suicídio diminuirá.
IMPULSIVIDADE
O impulso para cometer suicídio é transitório e dura poucos minutos ou horas. É comumente desencadeado por eventos negativos e estressores do dia-a-dia. Acalmando essa crise, um profissional em psicologia pode ajudar a diminuir o desejo suicida compreendendo a história de vida da pessoa com sinceridade e empatia e ajudando também com técnicas de controle mental, emocional e desenvolvendo novos planos de vida e busca por realização.
RIGIDEZ
Seus pensamentos, sentimentos e ações são focados no suicídio, e não são capazes de perceber outras maneiras de sair do problema, agindo drasticamente. É necessário ajudar a pessoa a encontrar uma postura mais flexível diante das adversidades, outras alternativas criativas encontrando motivação na vida. Não tente carregar o peso dessa missão sozinho motive a pessoa a buscar um psicólogo em algum centro público ou particular se puder.
ENTENDA OS MOTIVOS QUE LEVAM ALGUÉM
A COMETER SUICÍDIO
Na minha formação como psicóloga, tive a chance de vivenciar muitos pedidos de ajuda em relação aos pensamentos suicidas e de morte e suicídio e também com pessoas que tinham tentando colocar fim a sua vida e estavam em um pronto atendimento hospitalar. O que aprendi com todas elas é que os principais motivos são:
- Dificuldade financeira ou mudança no padrão familiar.
- Conflitos, sejam eles familiares, laboral, existencial, conjugal…
- Mudança repentina no seu padrão financeiro.
- Vergonha ou não aceitação social.
- Quadros depressão, onde a sensação de desesperança foi o gatilho.
- Descobrir uma doença (leia também meu artigo com conselhos para pessoas com algum diagnóstico recente).
- A sensação de conseguir acabar com o sofrimento emocional, que muitas vezes era maior do que qualquer dor física que a pessoa já tivesse sentido.
COMO IDENTIFICAR E AJUDAR ALGUÉM COM
TENDÊNCIAS SUICIDAS
1
UMA PESSOA COM PENSAMENTOS DE MORTE SEMPRE DARÁ SINAIS
O principal é que todas elas em algum momento tinham dado sinais para pessoas de sua confiança sobre sua intenção, com frases do tipo: “quero colocar fim nesse sofrimento”; “Não aguento mais essa vida”; “Quero fugir/desaparecer”.
Portanto, existem muitos motivos que levam aos pensamentos suicidas de colocar fim a própria vida, cada pessoa apresenta uma motivação, por isso é importante estar atento aos sinais que ficam implícitos, cada caso ou tentativa de suicídio é particular e única, jamais será algo universal e igualitário.
2
O SOFRIMENTO ESTARÁ PRESENTE NA HISTÓRIA DE VIDA DA PESSOA
O estopim para o suicídio é a existência de um sofrimento insuportável de ordem emocional, que(na cabeça da pessoa) não há forma de ser aliviada, sendo a única saída o ato contra si próprio. Essas pessoas não conseguem encontrar formas de recursos emocionais vitais para satisfazer as suas necessidades ou eliminar os conflitos, portanto a vida perde o sentido.
Atualmente, tem se falado mais sobre suicídio quebrando um pouco sobre o tabu que foi instalado nas ultimas décadas. Hoje já existem politicas publicas que se preocupam com esse assunto, já que o índice de casos de tentativa de suicídio tem aumentado com o passar dos anos em todas as faixas etárias e gêneros.
3
O PENSAMENTO DE MORTE VEM JUNTO COM A DESESPERANÇA
Essa é a principal crença existente na mente de uma pessoa potencialmente suicida, não consegue pensar em outras possibilidades para enfrentar as adversidades e angústias existentes que independe de ter ou não diagnóstico de transtornos psiquiátricos. Lembrando que a desesperança é o principal sintoma de quadros depressivos.
4
É IMPORTANTE SABER A DIFERENÇA ENTRE FATORES DE RISCO E FATORES DE PROTEÇÃO
Por risco entende-se a possibilidade de um perigo previsível, que ameaça a pessoa de sofrer dano à saúde ou à vida. O fator de risco pode ser qualquer característica ou acontecimento na vida de uma pessoa, ou de seu ambiente, que contribui para alterar negativamente suas reações comportamentais. O fator de risco insere-se em uma conexão com outros elementos da história da pessoa.
Os fatores de risco são divididos em fatores fixos e fatores potencialmente modificáveis. No primeiro grupo temos sexo, idade, grupos étnicos, orientação sexual, tentativas de suicídio prévias, transição socioeconômica dos países, anomia (falta de normas sociais), uso de drogas. No segundo grupo temos acesso aos métodos, doenças físicas, transtornos mentais, o isolamento social, desesperança, situação conjugal e situação ocupacional.
Os fatores de proteção como fatores que ajudam superação de pensamentos suicidas e de morte e na motivação para a vida. São os principais pontos a serem ativados quando conversamos com pessoas que pensam sobre suicídio ou mesmo como técnica mental para se apegar na hora de vencer os próprios pensamentos negativos.
Alguns exemplos são o desejo de ter um filho ou gravidez em curso, religiosidade, senso de responsabilidade com família, satisfação em viver, crianças em casa, presença de habilidades positivas de enfrentamento, suporte da rede social, planos para o futuro que não foram executados, além da relação terapêutica positiva.
Reforçar e/ou instalar alguns destes fatores pode diminuir o risco potencial de suicídio, apesar de alguns dos fatores modificáveis dependerem de processos terapêuticos longos, como o desenvolvimento de aspectos cognitivos de enfrentamento e solução de problemas, e outros dependerem de características de história pessoal.
Por isso faça os “primeiros socorros”, converse, acolha, mas sempre direcione para a ajuda profissional. E se for você que tiver pensamentos suicidas ou de morte, se apegue aos seus sonhos e demais fatores de proteção, e em primeiro lugar busque ajuda, até mesmo os maiores campeões e empresas do mundo buscam ajuda para superar suas crises, pense nisso 😉
5
IDENTIFIQUE, PROTEJA E PROCURE AJUDA PROFISSIONAL
Alguns sinais de que alguém precisa de ajuda pode ser por exemplo, a perda de interesse em atividades que antes tinha prazer em realizar, desinteresse por participar de reuniões entre amigos, familiares e atividades sociais, ter dificuldade em assumir qualquer tipo de responsabilidade, iniciar ou aumentar o uso de álcool e outras drogas, apresentar mudanças nas emoções repentinamente, entre outros.
O comportamento suicída comumente acontece durante a vigência de um contexto depressivo. Quando somente pensamentos negativos tomam conta da rotina e a desesperança no futuro se torna forte, é chegada a hora de procurar ajuda profissional.
O psicólogo vai ajudar no desenvolvimento de estratégias eficazes de resolução de problemas, desenvolver razões para viver baseado nos fatores de proteção, encontrar formas de melhorar as relações sociais e se necessário engajar em outros tratamentos para a complementação.
O foco central é encontrar estratégias que a pessoa possam usar para provocar esperança para o futuro e acrescentar sentido para suas vidas.
Devido a rigidez nos pensamentos a pessoa percebe o mundo sob a ótica dicotômica do bem e do mal, do certo e errado, e tem dificuldades em considerar novas perspectivas dos problemas. A falta de flexibilidade define que as pessoas com tendência suicída percebam poucas alternativas para as situações a serem enfrentadas. Este tipo de pessoa tende a assumir atitudes passivas diante da vida, as quais consistem em deixar a ação a critério dos outros, em confiar na sorte ou em esperar que as mudanças ocorram espontaneamente. Também pode se considerar a falta de habilidades sociais, já que se sentem inferiorizados, rejeitados e isolados dos outros.
Muitas pessoas acreditam que somente quem tem depressão apresenta ideação suicída, isso não é verdade, existem outras doenças ou características psicológicas que podem estar presente.
O mais importante é se permitir falar sobre seus sentimentos, emoções e pensamentos e procurar ajuda, todos nós lutamos para a manutenção da vida e se por acaso isso não está acontecendo é porque há algo errado. Pensar na morte como única forma de eliminar a dor, é o sinal mais que óbvio de que é necessário buscar ajuda.
SEJA LUZ PARA A ESCURIDÃO DE ALGUÉM
Toda pessoa em sofrimento necessita buscar alívio para a sua dor emocional, necessita ser acolhido no seu mais profundo sofrimento, precisa enxergar no terapeuta um aliado para encontrar estratégias que modifiquem a ideação ou a intenção suicida, estabelecendo estratégias que possam usar para promover esperança no futuro, proporcionando formas alternativas de interpretar e responder aos problemas em suas vidas, que só poderá ser atingida através de uma postura de aceitação.
Aprenda a identificar seus pensamentos e emoções, encontre formas assertivas de lidar com as frustrações e adversidades do cotidiano. O importante é aprender a se conhecer. Seu sofrimento pode ter fim, sem ser pela sua morte.
Caso você esteja pensamento em tirar sua própria vida, ou conheça alguém que indiretamente ou diretamente esteja falando sobre suicídio e necessite de uma orientação, busque ajuda, existem atendimentos públicos em centros especializados, como o CAPS, o Centro de Valorização da Vida (CVV) e caso seja possível economicamente falando um atendimento psicológico particular pode ser uma boa alternativa.
Para finalizar deixo duas palavras muito importantes:
FALE: Tem muitas pessoas que se importam com você, que irão te acolher, a morte não é a melhor saída, você já conseguiu superar muitas coisas que achava que não era capaz? Então, tenho certeza que você conseguirá encontrar outro caminho para aliviar seu sofrimento.
ESCUTE: Permita que as pessoas que estão se sentindo sem esperança e indigna de continuar vivendo expresse sobre seus sentimentos, não julgue, não duvide caso a pessoa apresente a intenção de cometer suicídio, encoraje a procurar ajuda especializada, valorize o quanto essa pessoa é importante para você, porque tenho certeza que se ela te escolheu para falar, você é importante para ela.
Espero ter contribuído para causa e para esse mês mundial de conscientização sobre um tema tão importante e que indica que nossa sociedade deve focar e muito em melhoria na busca por desenvolvimento humano, em todas as suas necessidades e potencialidades, e na qualidade de vida.
Deixo o convite para conhecerem meu consultório online. Onde atendo online pelo sistema do site usando a própria câmera do seu computador.
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